Desvios na Religião: Como Identificar e se Proteger

Desvios na Religião: Como Identificar e se Proteger
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O desvio na aqidah (crença) é uma das maiores ameaças à integridade da prática religiosa de um muçulmano. Existem diversas formas de desvio, porém acredito que o desvio mais perigoso e que tem maior impacto na crença de uma pessoa é aquele que nasce da capacidade intelectual do indivíduo e se apresenta em “defesa” do Islam, mas, preciso ressaltar que a religião é inocente: o culpado é apenas o muçulmano com sua ignorância ou falta de taqwah. O Qur’an nos exorta ao discernimento em inúmeras passagens como na surah Muhammad:

“E não ponderam eles o Alcorão, ou há cadeados em seus corações?” (Surah Muhammad, 47:24)


Esta exortação nos recomenda a ponderação sobre o que foi revelado, entretanto, diversas pessoas colocam seu nafs (seu ego) acima do din (religião) e interpretam os Textos Sagrados conforme suas preferências, de uma maneira que se adapte à sua vida e mantenha a sua comodidade intacta. A gente sabe que não há crescimento sem esforço, que nada que realmente valha a pena nessa vida vem através de conforto e comodidade. E isso é também um preceito islâmico, porque a jihad (ou seja, o esforço na religião) é algo muito importante no din. (Para mais informações sobre jihad, leia o artigo: artigo 1 artigo 2 artigo 3)

Esse fenômeno, interpretação e prática confortável ou tendenciosa da religião, é muito comum, e quando surge entre pessoas com um nível intelectual ou acadêmico mais elevado torna-se ainda mais perigoso, porque vem travestido de discurso lógico, ilustrado com argumentações sedutoras. O conhecimento mundano, muitas vezes, vem acompanhado de um ego muito inflado. Pessoas eloquentes e educadas normalmente conseguem conquistar através de seu raciocínio e isso é bem complicado quando, uma pessoa com esta habilidade interpreta o din de uma forma deturpada: tanto para uma extrema flexibilização da religião, quanto para o oposto. Para exemplificar, poderia citar inúmeros desvios neste sentido, mas vou mencionar apenas um: os grupos que defendem que o uso do hijab não é obrigatório ou, no extremo oposto, que o niqab é obrigatório, e, ambos discursos vêm acompanhados com argumentações lógicas e evidências apresentadas de forma descontextualizada e deturpada. As pessoas podem afirmar que isso não é um problema que extrapole o campo pessoal, porém, isso não é verdade, porque essas pessoas, geralmente, levam diversas outras ao desvio e causam rupturas na comunidade muçulmana, ou seja, enfraquecem ainda mais a nossa ummah.

Antes de continuar esta análise do desvio intelectual na aqidah, é preciso explicar o que é a aqidah. Esta palavra deriva do verbo ‘aqada/ta’quid, que em termos gerais, significa amarrar ou dar um nó; literalmente, aqidah significa amarrar, como dar nós em pedaços de uma corda para que ela se una e se torne mais firme. No Islam, aqidah é um ramo do conhecimento extremamente profundo. O muçulmano deve crer em seu coração e ter fé e convicção, sem dúvidas ou receios, pois Allah mencionou a aqidah em Seu Livro e através de Suas revelações a Seu Mensageiro (que a paz e as bênçãos de Allah estejam sobre ele). Portanto, a aqidah representa uma fé absoluta, completa, incondicional, firme e perpétua derivada da crença que habita no coração de cada muçulmano. Resumindo, aqidah se refere às questões que são conhecidas a partir do Qur’an e sunnah, e que o muçulmano deve acreditar em seu coração, como reconhecimento à Verdade de Allah e Seu Mensageiro.

“E não é admissível a crente algum nem a crente alguma – quando Allah e Seu Mensageiro decretam uma decisão – que a escolha seja deles, por sua própria decisão. E quem desobedece a Allah e a Seu Mensageiro, com efeito, se descaminhará com evidente descaminho.” (Al-Ahzab, 33:36)

E com este versículo entramos no Conceito de Desvio Intelectual

Desvio, literalmente, significa a mudança de uma rota, uma volta ou retorno e ainda, um erro ou descaminho. No Islam, quem se desvia (da aqidah) é aquele que rejeita, muda ou invalida a lei de Allah e de Seu Mensageiro (que a paz e as bênçãos de Allah estejam sobre ele).

Há vários tipos de desvio de aqidah, entretanto, um dos mais perigosos é o desvio intelectual (eu me refiro a este desvio como intelectual porque ele provém da capacidade intelectual do indivíduo), ele é relativamente variável de sociedade para sociedade – e isto confunde as pessoas com menos conhecimento na religião e as deixa em posição extremamente vulnerável. Algo considerado desvio em uma comunidade, pode não ser considerado em outra e isto está relacionado à diferença de valores e normas religiosas e condições sociais.

Qualquer ato ou atividade que esteja fora dos valores, sistemas e tradições de uma comunidade específica, ou fora de seus valores morais, ou, ainda, de suas normas ou padrões de comportamento apropriados é descartado. E quando uma sociedade é construída sobre alicerces não islâmicos é ainda mais fácil que os muçulmanos apresentem estes desvios intelectuais. Isso faz com que os muçulmanos ignorem regras e dogmas e os afasta da moderação no pensamento, também é a causa direta do surgimento de conflitos, do desvio de outras pessoas que se sentem mais confortáveis com o discurso distorcido e, ainda do aumento do número de escolas de pensamento desviadas com tendências sectárias.

As causas do Desvio na Aquidah

Os desvios não surgem do nada, portanto é fundamental compreender as suas razões para que se introduza formas de prevenção e proteção contra isso. Em sociedades como a brasileira, onde o Islam não é parte da cultura originária, é ainda mais fácil se desviar, porque o tecido social possui particularidades que, muitas vezes, são totalmente avessas à doutrina islâmica. Por exemplo: os juros são parte do nosso dia a dia, muitas pessoas lidam com os juros sem mesmo se importar com a ilicitude, porque está tão arraigado na cultura que a pessoa não consegue compreender a razão de ser proibido e, então, simplesmente não dá atenção àquilo; ou ainda, a rejeição quase infantil à poligamia, obviamente não estou dizendo que a poligamia deva ser praticada por todo mundo, até porque é uma prerrogativa do homem, não uma obrigatoriedade. Mas, o que quero dizer é que a maioria absoluta das mulheres que rejeita a poligamia, rejeita simplesmente porque a cultura cristã da monogamia já está arraigada no seu raciocínio, e não necessariamente porque ela refletiu sobre o assunto, despida das suas paixões e preconceitos. (Para entender melhor a poligamia, assista ao vídeo: clique aqui)

Muitos dos motivos dos desvios se sobrepõem e estão relacionados entre si, dificultando as possíveis soluções. Mas, não é impossível achar soluções, é necessário que a gente comece a identifica-los para nossa proteção, uma vez que nenhum de nós está totalmente seguro.

Eu vou pontuar aqui algumas causas do desvio e queria que o Sh Jihad continuasse esta análise falando para a gente como podemos nos proteger, proteger nosso din e nos aproximar ao máximo de uma vivência mais pura da nossa religiosidade:

1. Ignorância em relação à aqidah correta. Isso pode vir da ignorância, ou seja, do desconhecimento ou da negligência em relação ao conhecimento. Umar Ibn Khattab disse: “os laços do Islam serão destruídos um a um, quando surgirem pessoas que não conheçam ou não reconheçam a Jahiliyah (ignorância).”

2. Fanatismo (ta’assub) com as crenças dos ancestrais, ou seja a aderência ao que os antepassados cultuavam e Allah menciona isso no Qur’an:

“Quando lhes é dito: Segui o que Allah revelou! Dizem: Qual! Só seguimos as pegadas dos nossos pais!…” (al-Baqarah 2:170)

3. Seguir cegamente (Taqlid) as declarações das pessoas sobre aqidah sem conhecer a evidência ou o nível de autenticidade. Negligenciando a compreensão dos Textos revelados.

4. Extremismo ou exagero: que islamicamente falando é ultrapassar os limites que a religião nos impõe. E isso pode se apresentar de diversas formas, em diversos campos, tanto para um extremo muito radical, quanto para o outro extremo muito flexível.

5. A má comunicação entre pais e filhos e, especialmente, o mau exemplo dos pais. O Mensageiro de Allah disse: “Cada criança nasce em estado de Fitrah (instinto inato natural que reconhece Allah), mas seus pais fazem dela uma judia, cristã ou adoradora do fogo.” [sahihein] Os pais, portanto, desempenham um papel determinante no modo de vida da criança.

6. A falha no ensino e propagação do conhecimento. A falta de comprometimento entre os muçulmanos na obrigatoriedade de se repassar o conhecimento e corrigir uns aos outros quanto aos desvios na aqidah.


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