Uma Visão Limitada da Religiosidade

Uma Visão Limitada da Religiosidade
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A religião não está na aparência; muito mais que isso, ela cobre todos os aspectos da vida.


Em nome de Allah, O Clemente, O Misericordioso

Por Sheikh Sâmî al-Mâjid

Os muçulmanos compartilham do príncipio do monoteísmo e das bases de sua fé coletiva. Apesar de ter isso em comum, eles diferem em seu grau de religiosidade e piedade – ou o grau de seus pecados e iniquidade. Alguns são realmente opressores de sua própria alma, alguns afincos em fazer boas açōes, e outros encontram-se algures entre esses dois pontos. Essa divergência entre os muçulmanos não exclui ninguém dos laços de lealdade e afeição que deve existir entre eles. A todos são prometidos os “jardins da eternidade onde entrarão”. Até aqueles que são mais injustos com suas almas terão enfim sua admissão no Paraíso.

Há muitas formas da pessoa ser iníqua com sua própria alma. Na verdade, há tantas formas de se fazer isso como há formas de se ser pecaminoso. O mesmo pode ser dito quanto à virtude. Há muitas formas de se ser bom. Assim como o Inferno tem sete portas, o Paraíso tem oito. Haverá pessoas sendo chamadas a cada uma dessas portas; algumas até serão chamadas a todas as portas do Paraíso. Isso nos mostra que existe mais de uma manifestação de virtude. Esta não possui uma única face. Não podemos pintar um retrato único e dizer: “É isso que significa ser virtuoso. Não há nada além.”

Contudo, há pessoas que tomam uma certa forma de vestir e aparência, e usam-na como a única maneira de medir a temência de uma pessoa. Limitar a noção de religiosidade a aparências externas em vez da essência de alguém – onde o exterior se torna o único fator para qualificar a religiosidade de uma pessoa, de forma que sua presença não exige mais nada e sua ausência não pode ser compensada por nenhum outro fator – é um dos maiores erros no atual despertar da religião.

O “renascimento Islâmico ” trouxe transformações à sociedade muito além da mudança na aparência. Tem sido um despertar na fé, no discurso intelectual, na metodologia, na ética, e no aspecto emocional. Contudo, a terminologia que nasceu com esse despertar – como o termo “religiosidade ” – não abarca o amplo espectro de significados ou expressa totalmente o efeito que esse renascimento teve nas pessoas. Esses termos continuam tão restritos no escopo e superficiais no sentido quanto no primeiro dia em que foram inventados.

O termo “religiosidade” restringe-se à aparência externa. Os dois são tão intrinsecamente ligados que quem tem essa aparência é instantaneamente considerado religioso e temente, seja lá quais forem seus defeitos. Da mesma forma, quem não exibe esta aparência em cada aspecto importante é afastado da qualidade de religioso. Quaisquer outras boas características não irão redimir essa honra para ele, independentemente de quanto essas qualidades possam ser mais importantes que a aparência.

Nós podemos ver o quão descuidados e arbitrários esses julgamentos são; honras conferidas a uma pessoa após um simples olhar à sua aparência e estilo. Tais observações são, em verdade, mudas. Elas não nos dizem nada sobre o que a pessoa diz ou faz, enquanto são as palavras e ações de uma pessoa que nos apontam para quem ela realmente é. No entanto, estes julgamentos sumários tomam posse de uma língua após a outra, até que se tornam padrões pelos quais as pessoas definem piedade e virtude.

Por certo, não temos nada em que continuar avaliando o caráter de outras pessoas além daquilo que elas exibem externamente. Como disse ‘Umar: “Não contabilizamos de ti, a não ser o que aparece de tuas ações.” No entanto, nós temos que entender que são as açōes, a conduta moral e o que uma pessoa fala que formam esse aspecto externo dela, não meramente sua aparência externa. Sua “aparência” em si não indica nada a mais nem a menos. Ela não confirma nada, nem nega nada. Ela não traz nenhuma fonte de elogio ou de condenação além dela mesma. ‘Umar falou sobre açōes, não sobre roupas e aparências.

Religiosidade não é restrita ao ornamento do corpo, mas, sim, os sentimentos, emoções e tendências que emanam do coração e se traduzem no comportamento externo dos membros. Se as lealdades forem mantidas apenas através de um estrito círculo de ornamentos externos, a sociedade se dividirá em pequenas facções antagônicas, ou, no mínimo, que não cooperam umas com as outras. Essas divisões tendem a continuar crescendo até o ponto em que as pessoas sentem que não há nada em comum entre elas.

Portanto, é imprescindível que coloquemos assuntos da aparência externa na devida perspetiva que o Islam lhes reserva. Não devemos negligenciá-los ou diminuir sua importância. Eles são expressões externas da fé. Aqueles que os observam agem corretamente e aqueles que violam os ensinamentos Islâmicos referentes a eles agem mal. Mas é apenas isso. Quem adota essas maneiras não merece ter cada perfeição e virtude atribuídos a si por isso. Nem esses assuntos devem ser tratados como se fossem princípios básicos da fé em que se baseiam nossa lealdade ou repúdio, nosso amor ou inimizade. Assim como ninguém tem o direito de minimizar os ensinamentos Islâmicos referentes às aparências, da mesma forma ninguém tem o direito de maximizar a sua importância e declarar pessoas como virtuosas ou não, somente através delas.

Nenhuma pessoa sã pode discutir sobre o fato de que a presença de algumas características virtuosas em uma pessoa não significa necessariamente que ela é integralmente virtuosa no íntimo. Igualmente, a ausência de algumas características virtuosas não quer dizer que a pessoa não seja virtuosa internamente. Se todos podemos reconhecer este simples fato, por que alguns de nós fazem dessas indicações exteriores de piedade o fator decisivo para onde depositamos nossa lealdade e amizade?

Uma pessoa pode estar em falta com algumas qualidades virtuosas, mas ter outras muito mais importantes. Ela pode ter um coração puro, uma língua que se restringe de libertinagem e mau discurso, idéias corretas, bom caráter com as pessoas, generosidade ao gastar em caridade, firmeza na oração, integridade em cumprir os seus deveres com outros. Todas essas qualidades superiores devem ser postas de lado porque a pessoa falha com a aparência externa?

Não deveria uma pessoa que possui qualidades tão nobres ser mais querida em nossos corações do que alguém que tem uma aparência religiosa minuciosa, mas cujo caráter tem qualidades tão feias que seu exterior jamais poderiam esconder – como alguém que é arrogante com os outros, de discurso abusivo, que nega os direitos das pessoas, é invejoso, despreza e pensa mal de seus companheiros?

Nós temos que consertar a noção de religiosidade que as pessoas teem. Elas precisam perceber que ela não é restrita a algumas regras específicas sobre a aparência, nem é exclusividade de algum grupo que se distingue através da sua maneira de vestir. Dessa forma, protegemo-nos de ser enganados pelo aspecto exterior – um truque muito usado por homens ruins para ganharem o favor daqueles que desejam seduzir.

Corrigindo nossa noção de religiosidade, nós também seremos capazes de afastar a aversão que as pessoas mostram umas às outras através de seus julgamentos apressados que não passam de uma primeira impressão preconceituosa.

Finalmente, não quero que ninguém me entenda mal e ache que estou tirando a importância dos ensinamentos religiosos quanto à aparência , ou que estou dizendo que não há problema em negligenciar esse assunto. Não é isso a que me estou a referir. Apenas aponto que a pertinência desses assuntos não deve ser exagerada ao ponto que outras questões importantes sejam banalizadas.

Retirado de IslamToday.com


Fonte: http://en.islamway.net/article/14287/a-too-narrow-view-of-religiousness


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