Tafsir da Surah Abasa – Do Que Carranqueou (Capítulo 80)

Tafsir da Surah Abasa – Do Que Carranqueou (Capítulo 80)
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Visão Geral

Esta Surah discute certos princípios de grande importância. Ela é única em suas imagens e impressões. Além disso, ela combina seu efeito espiritual marcado com um ritmo musical esplêndido.


A primeira parte trata de um determinado incidente que aconteceu nos primeiros tempos do Islã. O Profeta (que a paz esteja com ele) estava ocupado com alguns dignitários coraixitas, explicando-lhes a mensagem islâmica quando Ibn Umm Maktum, um pobre cego, o interrompeu. Sem saber que o Profeta estava ocupado, o cego pediu-lhe repetidamente para ensinar-lhe alguns versículos do Alcorão. O Profeta (que a paz esteja com ele) não estava muito satisfeito com esta interrupção. Ele franziu a testa e se afastou de Ibn Umm Maktum. Esta Surah se inicia por criticar o comportamento do Profeta neste incidente. Estabelece claramente os valores e princípios sobre os quais a sociedade islâmica é fundada e afirma a verdadeira natureza da mensagem do Islã. “Ele carranqueou e voltou as costas, porque o cego lhe chegou. E o que te faz inteirar-te de que ele, talvez se dignifique? Ou se lembrem da Mensagem, e a lembrança o beneficie? Quanto ao que prescinde de ajuda, tu o ouves, atentamente. E nada te impende se ele se não dignifica. E, quanto ao que te chega correndo, enquanto receia a Allah, dele te desinteressas. Em absoluto, não o faças mais! Por certo, esses são uma lembrança – então quem quiser, disso se lembrará – registada em páginas honradas, elevadas, puras, em mãos de escribas honoráveis, virtuosos. ” (Versículos 1-16)

A atitude ingrata do homem para com Deus e Sua negação são discutidas na segunda parte. Aqui o homem é lembrado de sua origem; como sua vida é facilitada; como Deus determina sua morte e ressurreição; e como, depois de tudo isso, ele falha em cumprir suas ordens: “Que morra o ser humano! Como é ingrato! De que cousa Ele o criou? De gota seminal, Ele o criou; então determinou-o; em seguida, fê-lo morrer e fê-lo sepulto; depois, quando Ele quiser, ressuscitá-lo-á. Mas, em absoluto, ele ainda não realizou o que Ele lhe ordenou.” (Versículos 17-23)

A terceira parte orienta o homem a refletir sobre as coisas de interesse imediato para ele, isto é, a sua comida. A perfeição absoluta da criação é evidente no fornecimento de alimentos para o homem, como é óbvio na criação, harmonia e no próprio desenvolvimento do homem: “Então, que o ser humano olhe para seu alimento: Nós fizemos entornar a água abundantemente, em seguida, fendemos a terra suficientemente, e, nela fizemos brotar grãos, e videiras e hortaliças, e oliveiras e tamareiras, e pomares entrelaçados, e frutas e pastagens, tudo para gozo de vós e de vossos rebanhos.” (Versículos 24-32)

A parte final aborda “o soar ensurdecedor” e seus efeitos terríveis. O próprio som das palavras dá a impressão de horror. O “soar ensurdecedor” faz com que as pessoas não reconheçam nada ao seu redor. Seus rostos, no entanto, transparecem uma explicação lúcida do que está acontecendo com eles. “Então, quando chegar o soar ensurdecedor, um dia, quando a pessoa fugir de seu irmão, e de sua mãe e de seu pai, e de sua companheira e de seus filhos, nesse dia, para cada um destes, haverá uma situação que o preocupara. Nesse dia, haverá faces radiantes, sorridentes, exultantes. E, neste dia, haverá faces cobertas de poeira, cobri-las-á um negrume. Esses serão os renegadores de Fé, os ímpios.” (Versículos 33-42).

A pré-visualização rápida da Surah deixa um profundo efeito sobre o leitor. Sua mensagem e suas implicações são tão poderosas que nenhum coração humano pode evitar ser profundamente tocado, até mesmo por uma leitura rápida da mesma. Nas páginas seguintes tentaremos ilustrar alguns dos efeitos mais profundos de certas partes da Surah e que não são aparentes em uma primeira impressão.

A base dos valores sociais

“Ele carranqueou e voltou as costas, porque o cego lhe chegou. E o que te faz inteirar-te de que ele, talvez se dignifique? Ou se lembrem da Mensagem, e a lembrança o beneficie? Quanto ao que prescinde de ajuda, tu o ouves, atentamente. E nada te impende se ele se não dignifica. E, quanto ao que te chega correndo, enquanto receia a Allah, dele te desinteressas. Em absoluto, não o faças mais! Por certo, esses são uma lembrança – então quem quiser, disso se lembrará – registada em páginas honradas, elevadas, puras, em mãos de escribas honoráveis, virtuosos.” (Versículos 1-16)

As instruções divinas que se seguiram a partir deste incidente são muito mais profundas do que parece à primeira vista. Elas são realmente um milagre. Estas instruções, os princípios que elas buscam estabelecer e a mudança que pretendem realizar na sociedade são, talvez, o milagre mais importante do Islã. Mas as instruções são feitas aqui como um comentário direto sobre um único incidente. É parte do método corânico fazer uso de incidentes isolados, a fim de estabelecer princípios fundamentais e permanentes. Os princípios aqui estabelecidos e os seus efeitos práticos, como pode ser visto na sociedade islâmica antiga, são na verdade a essência do Islã. Eles constituem a verdade que o Islã, e todas as religiões divinas que o precederam, procuraram introduzir na vida do ser humano.

O ponto em questão aqui não é meramente como um indivíduo ou uma classe de pessoas devem ser tratados. Este é, realmente, o significado do comentário corânico sobre o incidente em si, porém, o cerne da questão é algo muito mais importante. Ele é: como as pessoas devem avaliar tudo em suas vidas? De onde elas devem obter os valores e padrões necessários para tal avaliação?

As instruções divinas contidas no inicio da Surah procuram estabelecer que as pessoas devem basear seus valores e padrões nas divinas considerações, estabelecidas por Deus, não em circunstâncias sociais, tradições ou práticas comuns. Nenhum conceito de vida deve ser baseado em tradições e eles não devem ser autorizados a determinar valores e padrões. Não há como negar as dificuldades na condução da vida em sociedade, com base em valores e padrões estabelecidos pelo Ser Divino, livre da pressão de todas as considerações mundanas.

Se considerarmos a pressão da sociedade sobre os sentimentos e atitudes do indivíduo, e o peso das considerações mundanas importantes, tais como os valores tradicionais, vínculos familiares e sociais, bem como os valores que prevalecem em seu ambiente, podemos entender a dificuldade de viver de acordo com estas instruções divinas. Nossa apreciação de tal dificuldade é ainda maior quando lembramos que, a fim de transmiti-las às pessoas, Muhammad (que a paz esteja com ele) precisou destas direções especiais, ou melhor, precisou ser repreendido. Esta referência é suficiente para mostrar a importância do assunto. Muhammad (que a paz esteja com ele) atingiu os níveis mais altos de sublimidade e grandeza que qualquer ser humano pode aspirar. No entanto, o fato de que as instruções especiais foram dirigidas a ele para transmitir um determinado princípio, o torna ainda maior, subliminarmente único. É, de fato, uma verdadeira descrição do princípio aqui estabelecido, ou seja, que a humanidade deve tirar seus valores e padrões do Ser Divino, após terem se libertado da pressão de suas configurações sociais, todos os seus valores e normas.

O padrão básico que Deus, através de seus profetas, ordenou a humanidade a adotar é: “Por certo, o mais honrado de vos, perante Allah é o mais piedoso.” (Surah 49:13). Este é o padrão pelo qual todos os valores, tradições e práticas devem ser avaliados. Ele estabelece um critério puramente divino que não tem nada a ver com qualquer consideração mundana. Mas as pessoas vivem em sociedade e estabelecem uma multiplicidade de vínculos, cada um com o seu próprio peso. Eles têm conceitos provenientes de relações familiares, poder e riqueza. A distribuição ou a concentração destes cria certos resultados práticos e econômicos que determinam a posição de cada homem, mulher ou classe de pessoas em relação aos outros. Assim, alguns adquirem uma posição superior à dos outros, em padrões mundanos.

Quando o Islã declara: “Por certo, o mais honrado de vos, perante Allah é o mais piedoso“, ele simplesmente indica que todos esses valores e considerações são nulos, ainda que nos pareçam importantes. São todos substituídos por um único valor proveniente diretamente de Deus. Além disso, este é o único valor aceitável por Ele. O incidente descrito aqui serve para estabelecer este valor em uma situação real. Assim, o princípio essencial é estabelecido: as escalas reconhecidas são as de Deus; o valor supremo que deve reger a vida humana provem dO Divino. Assim, a comunidade muçulmana deve abandonar todos os valores mundanos, normas, tradições e conceitos humanos.

Quem tem prioridade?

Vamos agora considerar o incidente em si. Ibn Umm Maktum, um pobre cego, vem ao Profeta (que a paz esteja com ele) no momento em que ele está ocupado com o grupo das personalidades mais poderosas e influentes de Meca, incluindo ‘Utbah e Shaybah, filhos de Rab?`ah, Abu Jahl, ‘Amr ibn Hisham, Umayyah ibn Khalaf, al- Wal?d ibn al-Mugh?rah. Também está presente al-`Abb?s ibn Abd al-Mutalib, o tio do Profeta. É um encontro crucial. O Profeta explica a mensagem do Islã para eles e espera por uma resposta favorável. Ele sente que a causa do Islã tem muito a ganhar com essa resposta. O Islã está enfrentando um momento difícil em Meca. Essas mesmas pessoas estão utilizando toda a sua riqueza, poder e influência para verificar o progresso do Islã e barrar as pessoas de aceitá-lo. Eles conseguiram congelar o Islã em Meca e dificultar seu progresso em outros lugares. Fora de Meca, as outras tribos adotaram uma atitude de esperar para ver. Para eles esta parece ser a melhor posição em uma sociedade que dá uma grande importância para a atitude da tribo. Eles estão cientes de que os próprios parentes de Mohammed (que a paz de Deus esteja sobre ele), o profeta do Islã, estão contra ele e, teoricamente, eles deveriam ser os seus apoiadores mais fervorosos.

Deve-se enfatizar que, quando dizemos que o Profeta está ocupado com estas pessoas, ele não tem interesse pessoal nelas. Ele está simplesmente trabalhando para o Islã. A aceitação do Islã por essas pessoas influentes e poderosas significaria a remoção de todos os impedimentos do caminho do Islã em Meca. Também garantiria para o Islã liberdade para progredir no resto da Arábia.

Embora esta reunião crucial esteja em andamento, um pobre homem chega e interrompe o Profeta (que a paz esteja com ele) e diz: “Mensageiro de Deus! Ensina-me alguns versículos que Deus lhe ensinou.” Embora ele podia sentir que o Profeta estava ocupado, ele repete seu pedido por diversas vezes. O Profeta não gosta desta interrupção. Seu rosto, que permanece invisível para o homem cego, expressa sua aversão. Ele franze a testa e desvia o olhar do pobre homem. Na verdade, o motivo do Profeta para tal é o seu grande entusiasmo para ganhar o apoio muito necessário para o Islã.

Aqui, o Céu intervém para dizer uma última palavra sobre este assunto e colocar pontos de referência que devemos utilizar para difundir a mensagem islâmica. Assim, são dadas as escalas para avaliar nossos valores, independentemente de todas as outras considerações, inclusive aqueles que podem aparecer servir aos interesses do Islã pela visão humana, incluindo a visão errônea de Muhammad (que a paz esteja sobre ele), o maior ser humano de toda a humanidade. É por isso que o Profeta que tem sido descrito em outras partes do Alcorão como tendo “grande e sublime natureza” (Surah 68:4), é fortemente censurado por Deus, o Altíssimo. É o único ponto no Alcorão onde o Profeta, que é muito querido por Deus, é dirigido pelo termo Kalla, (inadequadamente traduzido como “não de fato”). Kalla é um termo de censura e uma ordem para desistir. Isso ocorre porque o princípio violado é fundamental para a religião.

A reprovação é feita em um estilo único, que desafia a tradução na língua coloquial. A língua escrita tem que aplicar certas regras e observar algumas normas bem definidas. Estas regras amorteceriam os efeitos de estilo muito vívidos, caracterizado neste caso pelos seus toques rápidos e frases curtas, que são mais como reflexo e imagens instantâneas.

“Ele carranqueou e voltou as costas, porque o cego lhe chegou.” (Versículos 1-2). O uso da terceira pessoa aqui é significativo. Ele sugere que o assunto é tão desagradável a Deus que Ele não gosta de confrontar seu amado Mensageiro diretamente. É um gesto de misericórdia e de bondade para com o Profeta. Assim, a reprovação proveniente da ação, foi feita com grande sutileza. A reprovação, em seguida, assume a forma de discurso direto, começando um pouco mais branda: “E o que te faz inteirar-te de que ele, talvez se dignifique?” (Versículos 3-4). Como você pode afirmar que uma grande vitória pode ter sido conseguida? Isso quer dizer que o homem pobre, cego que veio até você buscar a luz poderia ter lucrado pela lembrança de Deus e começou a purificar a si mesmo. Seu coração poderia ter sido iluminado pela luz de Deus e ele poderia ter se tornado como um farol, orientando as pessoas para a segurança. Isto é exatamente o que acontece cada vez que um ser humano, genuinamente, aceita a fé. É, de fato, o que tem peso real na balança de Deus.

A reprovação em seguida, toma um tom mais forte. Revolve na ação em questão: “Quanto ao que prescinde de ajuda, tu o ouves, atentamente. E nada te impende se ele se não dignifica. E, quanto ao que te chega correndo, enquanto receia a Allah, dele te desinteressas.” (Versículos 5-10). Aquele que finge que pode ficar sem você, sua religião, a luz, a bondade e a pureza é aquele que recebe sua atenção! Você é que vai para ter com ele enquanto ele se afasta. Você está se esforçando ao máximo para tentar convencê-lo a aceitar a fé. “E nada te impende se ele se não dignifica.” (Versículo 7). O que significa para você, se eles optarem por permanecer na imundície? Você não será responsável pelos pecados deles. Eles não irão garantir a tua vitória. “E, quanto ao que te chega correndo”, de sua livre e espontânea vontade “Enquanto receia a Allah”, tateando as coisas com as mãos estendidas, com medo de obstáculos, “dele te desinteressas”. É, realmente, uma forte descrição de não dar a devida atenção ao homem que veio buscar orientação correta.

Em seguida, o tom de reprovação torna-se ainda mais forte, tornando a censura definitiva: Kalla, que significa “não, de fato!”, isto nunca deve ser o caso.

Depois, segue-se a afirmação de que o Islã é um chamado honroso e nobre, não tendo a necessidade de apoio de ninguém. Ele só se preocupa com quem o aceita em sua totalidade, independentemente de sua posição social na sociedade mundana! “Em absoluto, não o faças mais! Por certo, esses são uma lembrança – então quem quiser, disso se lembrará – registada em páginas honradas, elevadas, puras, em mãos de escribas honoráveis, virtuosos.” (Versículos 11-16). É uma mensagem nobre e honrada em todos os aspectos. Suas páginas são purificadas e exaltadas, confiada a anjos embaixadores “nobres e piedosos” que transmitem para seres humanos selecionados, que por sua vez, transmitem às pessoas. Também é digno. Ninguém que finge ser autossuficiente precisa ser abordado para aceitar a mensagem do Islã. É somente para aqueles que sabem o seu valor e procuram ser purificados por ela.

Portanto, este é o padrão divino pelo qual todos os valores e considerações devem ser avaliados, e todas as pessoas devem ser julgadas. Esta é, também, a palavra de Deus, que é o julgamento final em todas as situações.

Mas onde e quando isto foi estabelecido? Foi estabelecido em Meca, quando os muçulmanos eram poucos em número, e o Islã era o lado mais fraco em uma batalha desigual. A tentativa de vencer um grupo de homens influentes e poderosos não foi motivada por nenhum interesse pessoal. Ignorar o pobre cego não foi devido a qualquer consideração pessoal. Tudo era por causa da nova mensagem. Mas a mensagem em si apela para a adoção e aplicação deste padrão destes valores. Para o Islã, nunca se pode adquirir qualquer poder real ou alcançar qualquer vitória verdadeira, exceto através do estabelecimento de tais valores e normas.

Como afirmado anteriormente, o princípio essencial envolvido é muito maior e mais amplo do que este único incidente. A humanidade deve derivar seus valores e normas de Deus, não de qualquer fonte mundana. “Por certo, o mais o mais honrado de vós perante Allah é o mais piedoso”. (Surah 49: 13). Na verdade, aquele a quem Deus considera nobre é aquele que merece ser atendido e cuidado, mesmo que ele seja completamente desprovido de boas relações familiares, poder, riqueza e bens valorizados de acordo com os padrões mundanos. Estes e todos os outros valores mundanos são inúteis quando eles se separam da fé e do temor a Deus. Esta é a grande questão que a instrução divina neste Surah procura resolver.

Uma repreensão e um princípio

O Profeta ficou profundamente tocado por estas instruções divinas e pela reprimenda de Deus. Ao longo de sua vida, ele trabalhou incansavelmente para o estabelecimento deste grande princípio na sociedade islâmica.

A primeira ação tomada por ele foi anunciar estas instruções e a reprovação em público. Isto em si é algo muito grande. Nenhuma pessoa que não fosse um verdadeiro mensageiro de Deus teria anunciado em público que ele tinha sido tão fortemente censurado por seu deslize. Para qualquer outro grande homem, teria sido suficiente reconhecer seu erro e evitar falar no assunto no futuro. Mas para o Mensageiro de Deus, porém, as coisas adquirem proporções diferentes. Nenhuma outra pessoa que não fosse o Mensageiro de Deus teria tido coragem para fazer esta declaração, visto que o Islã estava enfrentando problemas, desafiando os mestres coraixitas, que eram muito orgulhosos de sua linhagem, poder e riqueza.

Estas eram, na época, as únicas considerações de importância na sociedade de Meca, onde as pessoas se perguntavam: “Que este Alcorão houvesse sido descido sobre um homem notável, das duas cidades.” (43: 31). Eles eram, obviamente, cientes da linhagem de Mohammed, e sabiam que ele era um descendente de uma família nobre na Arábia. Seus antepassados ??eram senhores de Meca. Eles, no entanto, fizeram a pergunta: por que Mohammed não ocupava uma posição de poder em Meca antes de sua missão profética?

Em tal sociedade, naquele momento em particular, um grande princípio nunca poderia ter sido produto de qualquer fator terreno. Ele só poderia ter tido uma fonte: Deus. Nenhum tipo de poder mundano poderia ter ido ao encontro da vontade divina.  A sociedade islâmica recebeu este principio diretamente do Profeta. Em seguida, tornou-se bem estabelecido o conceito de importância e momento, o que ajudou a comunidade islâmica a continuar sua operação ao longo dos séculos.

O estabelecimento deste princípio foi, de fato, um renascimento da humanidade. Foi de maior importância que o nascimento do primeiro homem. O homem foi capaz de libertar-se de todos os laços e padrões mundanos, sendo capaz de substituí-los por um conjunto celeste de valores independentes de todas as considerações terrenas. Estes novos valores foram logo compreendidos e aceitos por todos. Em seguida, a mensagem relacionada ao túmulo, que exigiu um direcionamento especial, emitida ao profeta Mohammed, o mensageiro de Deus, e uma ordem para ele para repassar essa mensagem em detalhes, tornou-se o princípio operativo da consciência islâmica e o código básico da sociedade islâmica. Permaneceu assim por um longo período.

Talvez não possamos apreciar plenamente a verdadeira natureza deste renascimento da humanidade, porque não podemos conceber o significado prático da nossa libertação das pressões do meio social, de valores, normas, tradições e práticas. Para entender a magnitude dessas pressões, podemos pegar como exemplo os defensores de uma visão materialista da história, que consideram a condição econômica de uma determinada sociedade fator determinante para suas crenças, artes, literatura, leis e costumes, bem como a sua visão de vida e do seu destino. Esta é, com certeza, uma visão estreita e equivocada da verdadeira natureza do homem! Foi com o princípio básico revelado por Deus que o Islã conseguiu o milagre do renascimento do homem.

Incutindo um novo valor

Desde o incidente, os valores ligados a este grande princípio tornaram-se supremos. Sua preponderância, no entanto, não foi de forma fácil, nem na sociedade árabe, nem nas mentes dos próprios muçulmanos. O Profeta foi capaz de implantar esse princípio islâmico básico nas mentes de seus companheiros e na vida da sociedade islâmica através de suas ações e diretrizes, carregada pelo profundo efeito que as instruções divinas reveladas nesta Surah deixaram sobre ele. Ele cuidou de sua nova “planta” com cuidado imensurável, fazendo com que ela estabelecesse raízes profundas e pudesse espalhar os seus largos ramos. Devido a isso, este princípio se manteve durante séculos, o princípio orientador da comunidade muçulmana.

Após este incidente, o Profeta dava boas-vindas e cumprimentava Ibn Umm Maktum calorosamente. Sempre que o via, ele dizia: “Bem-vindo o homem por quem o meu Senhor me reprovou”. Em duas ocasiões, o Profeta o nomeou seu vice-governador em Medina enquanto ele teve que se afastar.

O Profeta casou-se com sua própria prima Zainab bint Jahsh do clã Asad, mesmo clã do seu ex-escravo Zayd ibn Harithah. Este casamento sempre foi uma questão muito delicada, particularmente na Península Arábica naquele momento. O motivo do Profeta para este casamento foi quebrar de uma vez por todas com todos os valores sociais e normas baseadas em considerações mundanas.

Logo depois que os muçulmanos de Meca se estabeleceram em Medina, o Profeta estabeleceu um vínculo de fraternidade entre cada dois muçulmanos. Ele fez do seu próprio tio, Hamzah, irmão de seu ex-escravo, Zayd; foram declarados irmãos, também, Khalid ibn Ruway?ah, da tribo Khatham, e Bilal, o ex-escravo.

Ele nomeou Zayd como comandante-chefe do exército muçulmano que lutou na Batalha de Mu’tah. O segundo no comando, depois de Zayd foi o próprio primo do Profeta Ja`far Ibn Abi Talib. E em seguida, vinha Abdullah ibn Rawaha, dos Ansar. Um número de personalidades conhecidas de Meca e Medina estavam naquele exército de três mil homens, incluindo o mais famoso comandante muçulmano de todos os tempos, Khalid ibn al-Walid. O Profeta se despediu pessoalmente deste exercito quando eles saíram para a batalha. É importante mencionar que Zayd e seus dois adjuntos foram mortos durante a batalha.

A última ação do Profeta foi nomear Usamah ibn Zayd, um jovem, como comandante de um exército que formado para lutar contra os bizantinos. Um grande número de primeiros muçulmanos convertidos estavam naquele exército, tanto do Muhajirin (Makkans) como do Ansar (Madinans), incluindo seus dois companheiros mais ilustres e sucessores imediatos, Abu Bakr e ‘Umar, bem como um parente do Profeta, Sa’ d Ibn Abi Waqqas, uma das primeiras pessoas a abraçar o Islã. Algumas pessoas, no entanto, queixaram-se sobre o fato que Usamah tinha sido apontado comandante, jovem como era. Abdullah ibn Umar retoma a história: “Quando algumas pessoas se queixaram do comando do exército ter sido dado para Usamah, o Profeta disse: ‘Vocês estão depreciando a sua nomeação como comandante da mesma forma como anteriormente vocês depreciaram a nomeação de seu pai. Por Deus, o pai dele foi um comandante digno, e uma das pessoas mais queridas para mim. Usamah também é uma das pessoas mais queridas para mim.” [Relatado por Al-Bukhari, Muslim e al-Tirmidhi].

Algumas pessoas falaram mal do companheiro do Profeta, Salm?n, o persa. Eles tinham uma visão nacionalista equivocada e falaram da inferioridade dos persas em relação aos árabes. O Profeta deu um passo decisivo para erradicar tais tendências errôneas. Ele declarou: “Salm?n pertence à família do Profeta.” [Relacionados por al-Tabarani e al-Hakim]. Esta afirmação transcende toda a linhagem, tribal e considerações nacionalistas, pregadas fervorosamente na Arábia.

Um desentendimento ocorrido entre Abu Dharr e Bilal, dois dos Companheiros altamente conceituados do Profeta. Em um acesso de raiva, Abu Dharr chamou Bilal de “O filho de uma mulher negra”. O Profeta ficou extremamente chateado com isso e repreendeu Abu Dharr dizendo: “Isso é demais, Abu Dharr. Quem tem uma mãe branca não tem vantagem sobre o filho de uma mãe negra.” [Relatado por Ibn al-Mubarak, com uma redação ligeiramente diferente]. Assim, o Profeta colocou a disputa em sua perspectiva correta. O que distingue as pessoas é a sua fé, e não a sua cor. Este é o critério islâmico, que é tão diferente dos critérios mundanos das sociedades dos tempos da Jahiliyyah (ignorância). A repreensão do Profeta teve um efeito profundo em Abu Dharr, que era muito sensível. Ele queria expiar seu erro, então ele colocou a cabeça no chão jurando que ele não iria levantar até que Bilal tinha posto o pé sobre ela.

Bilal alcançou uma posição de grande destaque na sociedade islâmica. O que fez a sua realização possível foi a aplicação dos valores divinos. Abu Huraira relatou que o Profeta disse uma vez para Bilal: “Diga-me, qual de suas ações você espera que lhe traga maiores recompensas, visto que, na noite passada, eu ouvi os seus passos se aproximando de mim no paraíso.” Bilal respondeu: “Eu acho que, desde que me tornei muçulmano, não existe nada que eu espere ser mais gratificante do que toda vez que eu realizo a ablução, a qualquer hora do dia ou da noite e me ponho a rezar tanto quanto puder.” [Relatado por Al-Bukhari e Muslim].

Uma vez que Ammar ibn Yasser pediu permissão para ver o Profeta. O Profeta disse: “Deixe-o entrar. Bem-vindo os puros, bom homem.” [Relatado por al-Tirmidhi]. E acrescentou: “Ammar é cheio de fé até o topo da sua cabeça.” [Relatado por al Nasa’i]. Hudhayfah relatou que o Profeta disse: “Eu não sei quanto tempo ficarei com vocês, por isso devem aceitar a liderança dos dois que me sucederão [e ele apontou para Abu Bakr e ‘Umar], e seguir a orientação de Ammar. Acreditem no que Ibn Mas’ud diz-lhes. “[Relatado por al-Tirmidhi].

 Ibn Mas’ud era tão próximo do Profeta que qualquer estrangeiro em Medina teria achado que ele era um membro da família do Profeta. Abu Musa disse: “Eu vim para Medina, do Iêmen, com meu irmão. Por algum tempo estávamos sob a impressão de que Ibn Mas’ud e sua mãe pertenciam à família do Profeta, uma impressão que havia se formado por causa da frequência de suas idas e vindas a casa do Profeta, e sua longa convivência com ele.” [Relatado por al- Bukhari e Muslim e al-Tirmidhi.]

O próprio Profeta pediu a mão de uma mulher Ansari em casamento para Julaybib, um ex-escravo. “Seus pais estavam relutantes em sancionar tal casamento. Ela, porém, lhes disse: ‘Vocês querem rejeitar um pedido do Profeta? Se o Profeta acha que esse homem é adequado para nós, então deixe esse casamento acontecer.’ Então, eles deram o seu consentimento.” [Relatado por Ahmad]. Logo após seu casamento, Julaybib participou de uma expedição armada. Após a batalha, o que resultou em uma vitória para os muçulmanos, o Profeta perguntou a seus companheiros: “Está faltando alguém?”. Eles nomearam algumas pessoas. Ele repetiu a questão e deram o nome de alguns outros. Ele fez a mesma pergunta pela terceira vez e eles responderam negativamente. Ele disse: “Eu acho que Julaybib está faltando.” Eles olharam ao redor e encontraram seu corpo próximo a sete soldados inimigos a quem ele havia matado. O Profeta passou por cima dos corpos, e parou próximo a ele, e disse: “Ele matou sete antes que ele próprio fosse morto. Este homem me pertence e eu pertenço a ele.” Ele o ergueu e o segurou em seus braços até que um túmulo havia sido cavado. Ele, então, colocou-o em seu túmulo. O relato não especifica se foi feita a lavagem dos mortos em Julaybib ou não. [Relatado por Muslim.]

O princípio em prática

Com esta instrução e sob a orientação do Profeta, o renascimento da humanidade foi realizado de uma maneira única. Assim, uma nova sociedade passou a existir, que importou seus valores e padrões de Deus, e viveu na terra sem interferência de restrições terrenas. Este é o maior milagre do Islã; um milagre que não poderia ter acontecido, exceto pela vontade de Deus, e por meio das ações do Profeta. Este milagre é, em si, uma prova de que o Islã é uma religião revelada por Deus, e que o homem que a transmitiu para nós foi o Seu Mensageiro.

Era vontade divina de que a liderança da sociedade islâmica, após a morte do Profeta, deveria ser atribuída sucessivamente a Abu Bakr e ‘Umar, os dois que tinham mais consciência da verdadeira natureza do Islã e foram os mais impactados pela orientação do Profeta. Na verdade, Abu Bakr e ‘Umar superaram todos os outros em seu amor pelo Profeta e determinação em seguir muito de perto os seus passos. Abu Bakr estava bem ciente do objetivo do Profeta na atribuição do exército sob o comando de Usamah. Sua primeira ação depois que se tornou califa foi enviar o exército reunido pelo Profeta, e comandado por Usamah, em sua missão original. Abu Bakr, o Califa, foi junto com o exército para os arredores de Medina para se despedir. Foi uma cena estranha: Usamah em seu cavalo enquanto Abu Bakr andava a pé. Usamah, o jovem comandante, se sentiu envergonhado, pois ele estava a cavalo, enquanto o califa, um velho homem, andava a pé. Ele implorou a Abu Bakr para montar, ou então ele iria caminhar ao lado dele. Abu Bakr se recusou, dizendo: “Você não deve andar e não vou montar. Não vai me causar nenhum dano caminhar por uma hora, se a minha caminhada é pela causa de Deus”.

Abu Bakr sentiu que precisava de ‘Umar para ajudá-lo a arcar com as responsabilidades de governar. ‘Umar, no entanto, era um soldado do exército de Usamah, então ele teve que pedir a permissão de Usamah para liberá-lo. Por isso, o califa, o chefe de Estado, disse ao comandante do exército: “Se você acha que pode poupar ‘Umar para me ajudar, então, por favor, o libere!” Que pedido! É a magnanimidade, atingível apenas através da vontade de Deus, por indivíduos bem ensinados pelo Mensageiro de Deus. Poucos anos depois, ‘Umar assumiu a liderança da comunidade muçulmana, como o segundo Califa. Uma de suas ações foi a de nomear Ammar ibn Yasser, que, anteriormente, pertencia às classes mais baixas de Meca, como governador da região de Kufa, no Iraque.

Um dia, um grupo de dignitários coraixitas, incluindo Suhayl ibn `Amr e Abu Sufyan, procurava encontrar-se com `Umar. Ele deixou-os esperando, enquanto conversava primeiramente com Suhaib e Bilal, dois ex-escravos, em razão da sua rápida aceitação do Islã e sua participação na batalha de Badr. Abu Sufyan estava com raiva e disse: “Eu nunca vi nada como este dia. Estes escravos são admitidos primeiro enquanto nós esperamos”. Suhayl, que estava mais profundamente consciente da verdadeira natureza do Islã, disse: “Senhores! Vejo em seus rostos uma expressão do que vocês sentem, mas eu digo a vocês que, se vocês estão com raiva, deveriam estar com raiva de si mesmos. Tanto eles como vocês foram chamados para aceitar Islã ao mesmo tempo. Eles foram rápidos em responder, mas vocês foram lentos. O que vocês farão se no dia do julgamento vocês descobrirem que eles estão entre os escolhidos e vocês entre os deixados para trás?”.

`Umar atribuiu a Usamah ibn Zayd uma parcela maior dos despojos de guerra do que ele atribuiu a seu filho Abdullah. Quando Abdullah foi consultar seu pai, ‘Umar, sobre a sua decisão, ele disse: “Filho, o Profeta amava Zayd mais do que amava seu pai, e ele amava Usamah mais do que ele amava você. O que fiz foi simplesmente dar maior valor para o amor do Profeta do que para o meu próprio amor”. Quando ele disse isso, ‘Umar estava plenamente consciente de que o Profeta media o seu amor pelos padrões divinos.

`Umar enviou Ammar para questionar Khalid ibn al-Walid, o comandante vitorioso de um exército muçulmano, que pertencia a uma família nobre, sobre determinadas acusações. `Ammar amarrou o pescoço de Khalid com suas próprias vestes. Alguns relatos acrescentam que ele amarrou as mãos de Khalid durante o interrogatório com o seu turbante. Quando a investigação provou a inocência de Khalid, `Ammar desamarrou e colocou o turbante de Khalid em sua cabeça com suas próprias mãos. Khalid não se opôs a este tratamento. Ele sabia que `Ammar foi um dos primeiros companheiros do Profeta. Khalid também sabia o que o Profeta dizia a respeito de ‘Ammar, conforme já citamos.

‘Umar costumava dizer sobre Abu Bakr e Bilal: “Abu Bakr é nosso mestre e ele libertou nosso mestre”. Isto se refere aos dias em que Bilal foi escravo de Umayyah ibn Khalaf, que lhe torturou impiedosamente, a fim de tirá-lo do caminho do Islã. Abu Bakr comprou Bilal de Umayyah e libertou-o. Este ex-escravo, Bilal, é descrito por ‘Umar, o Califa, como “nosso mestre”. ‘Umar também disse: “Se Salim, o ex-escravo de Abu Hudhayfah, estivesse vivo eu o teria nomeado para suceder-me”. Esta declaração deve ser observada atentamente, pois ‘Umar não nomeou ninguém para sucedê-lo, nem mesmo Uthman, Ali, Talhah ou al-Zubair. Ele somente nomeou uma comissão de seis, de modo que o próximo califa deveria ser escolhido dentre eles.

Ali Ibn Abi Talib enviou Ammar e Al-Hasan, seu próprio filho, para Kûfah para buscar apoio das pessoas contra A’ishah (que Deus esteja satisfeito com ela). Sua mensagem dizia: “Eu sei que ela é a esposa de seu Profeta nesta vida e na vida futura. No entanto, vocês estão sendo confrontados com um teste que vai provar se você segue o seu Profeta ou a sua esposa.” [Relatado por al-Bukhari]. O povo de Kûfah aceitou seu caso contra A’ishah, mãe dos crentes e filha de Abu Bakr (que Deus esteja satisfeito com todos eles).

Bilal foi convidado por seu irmão no Islã, Abu Ruway?ah de Khatham, para falar em seu nome à família de uma mulher iemenita a quem ele desejava casar-se. Bilal fez isso, dizendo: “Eu sou Bilal Ibn Rabah e este é meu irmão, Abu Ruway?ah. Ele não tem bons costumes e crença firme. Você pode vir a se agradar se você lhe conceder a sua filha em casamento ou não”. Ele não os enganou, escondendo a verdade. Mesmo fazendo papel de mediador, não esqueceu sua responsabilidade para com Deus. A família em questão ficou satisfeita com tal honestidade. Eles casaram sua filha com Abu Ruway?ah, um nobre árabe, que teve como mediador Bilal, um ex-escravo da Abissínia.

Este princípio fundamental permaneceu firmemente enraizado em toda a sociedade islâmica por séculos, apesar dos vários fatores que conspiravam ao contrário. Abdullah ibn Abbas foi sempre recordado como sendo relacionado com seu escravo `Ikrimah, enquanto` `Abdullah ibn Umar foi sempre lembrado juntamente com seu escravo N?fi`. Anas ibn Malik foi sempre associado ao seu escravo Ibn Sirin, assim como Abu Huraira com seu escravo `Abd al-Rahman ibn Hurmuz.2. Na geração que se seguiu, os estudiosos mais ilustres foram al-Hasan em Basra, Mujahid ibn Jabr, ‘Ata’ ibn Rabah e Tawus ibn Kays?n. No Egito, Yaz?d Ibn Abi Habib, um escravo negro de Dengla, foi o grande Mufti (detentor da mais alta posição de autoridade religiosa) durante o reinado de ‘Umar ibn `Abd al-`Az?z.3

Esta norma divina continuou a ganhar grande respeito entre os piedosos e tementes a Deus, mesmo quando eles eram privados de todas as coisas mundanas consideradas valiosas. Somente em tempos relativamente recentes que este padrão divino deixou de funcionar. Atualmente, o mundo inteiro está tomado por uma maré de Jahiliyyah, no qual há um total desrespeito pelos valores divinos. Nos Estados Unidos, o principal país ocidental, uma pessoa é avaliada de acordo com o tamanho da sua conta bancária. Na União Soviética.4 , onde o comunismo era a filosofia dominante, a vida é encarada somente como a matéria em si, e uma pessoa vale menos do que uma máquina. As terras consideradas muçulmanas, por outro lado, tem afundado novamente para a Jahiliyyah. Os credos da Jahiliyyah, que o Islã tinha erradicado, estão sendo revividos. O padrão divino foi abando’Umar nado em favor de valores materialistas que são completamente contrários ao Islã.

A única esperança que resta é que o movimento revivalista islâmico resgate a humanidade mais uma vez das garras da Jahiliyyah e a traga para o seu segundo renascimento, semelhante ao anunciado pelos versículos decisivos na abertura do desta Surah.

Atitude arrogante do homem

A segunda parte da Surah fala sobre a vaidade do homem e como ele vira as costas para a verdadeira fé. Divaga a respeito da forma como o homem se esquece de suas origens humildes, e como ele permanece totalmente alheio ao cuidado de Deus e de Seu poder total sobre todas as fases da existência humana, tanto nesta vida, como na derradeira vida. Em sua ingratidão, o homem não cumpre seus deveres para com o seu Senhor, que o criou e o sustentou e que vai ressuscitá-lo para prestar contas por suas ações: “Que morra o ser humano! Como é ingrato! De que cousa Ele o criou? De gota seminal, Ele o criou; então, determinou-o; em seguida, facilitou-lhe o caminho; em seguida, fê-lo morrer e fê-lo sepulto; depois, quando Ele quiser, ressuscitá-lo-á. Mas, em absoluto, ele ainda não realizou o que Ele lhe ordenou.” (Versículos 17-23). A sensação de horror é descrita por esta atitude abominável. “Como é ingrato!” Ele nega veementemente as afirmações de sua criação. Se ele tivesse sido consciente destas pretensões, ele teria sido humildemente grato ao seu Senhor, que o criou. Ele não teria mostrado essa arrogância e teria obedecido ao seu Criador.

Na verdade, como pode o homem ser tão arrogante e vaidoso? Quais são suas origens: “De que cousa Ele o criou?” (Versículo 18). A sua origem é muito humilde, sem valor, de fato, exceto pela graça de Deus. “De gota seminal, Ele o criou; então, determinou-o” (Versículo 19). A gota seminal insignificante é o início do homem. Deus, o Criador, em seguida, faz o homem em proporção. O verbo árabe usado aqui qaddara, que denota precisa e meticulosa dosagem e proporção. Também denota conferindo peso e valor. É assim que o homem é criado, honrado e elevado, a partir de suas origens humildes, a uma alta posição em que o mundo inteiro foi colocado à sua disposição.

“Em seguida, facilitou-lhe o caminho” (Versículo 20). O caminho da vida foi facilitado para ele. A ele, também, foi dada a capacidade de reconhecer e seguir o caminho certo. Quando a jornada da vida termina e todos os seres vivos encontram o seu fim inevitável, “Em seguida, fê-lo morrer e fê-lo sepulto” (Versículo 21). Logo, no final, dá-se como no início: o homem se submete ao seu Senhor, que Ele traz para a vida quando quer e termina sua vida quando quer. Ele honra o ser humano, fazendo da terra sua última morada, ao invés de deixá-lo como alimento para os animais selvagens. Ele tornou parte da natureza humana o enterrar dos mortos. Quando o tempo que Ele nomeou chegar, Ele o trará de volta à vida para o acerto de contas: “Depois, quando Ele quiser, ressuscitá-lo-á” (Versículo 22). Então, o homem não ficará sem recompensa ou castigo.

Mas o homem tem se preparado para esta conta? Parece que não: “Mas, em absoluto, ele ainda não realizou o que Ele lhe ordenou” (Versículo 23). A humanidade como um todo, desde o primeiro ao último, não terá cumprido as ordens de Deus. Esta é a conclusão da expressão árabe usada aqui, Lamma Yaq?i m? Amarah. O homem será sempre negligente em relação aos seus deveres. Ele nunca vai lembrar de suas origens e criação como deveria, nem agradecer e louvar o seu Criador, que o guiou e o cuidou, como Ele deve ser agradecido e elogiado. O homem não se prepara nesta vida para o dia da recompensa e retribuição. Isto se aplica à humanidade como um todo. Além disso, a grande maioria das pessoas, devido a sua arrogância, vira as costas para a orientação divina.

Reflexão útil

Em seguida, a Surah convida o homem a refletir sobre sua comida e seu gado, o que é uma das muitas coisas que Deus provê para ele: “Então que o ser humano olhe para seu alimento: nós fizemos entornar a água abundantemente, em seguida, fendemos a terra, suficientemente, e, nela fizemos brotar grãos, e videiras e hortaliças, e oliveiras e tamareiras, e pomares entrelaçados, e frutas e pastagens.” (Versículos 24-32).

Esta é a história da comida do homem, relacionada aqui etapa por etapa. Para o homem refletir: ele desempenha qualquer papel significativo nela? Ele pode determinar ou alterar o seu curso? Na verdade, a mesma Mão que deu a vida, trouxe a luz e a comida que o sustenta.

Então que o ser humano olhe para seu alimento” (Versículo 24). A alimentação é a primeira necessidade da vida humana e merece algumas reflexões. Está disponível dia após dia. Mas por trás de tudo está uma história simples e maravilhosa. No entanto, tal simplicidade faz o homem esquecer o seu significado. No entanto, é tão milagroso como a própria criação do homem. Cada passo é determinado pela Vontade Suprema que criou o homem.

Nós fizemos entornar a água abundantemente” (Versículo 25). A chuva é um fato conhecido a todos os seres humanos, onde quer que ele habite, independentemente de seu nível de experiência ou conhecimento. É, portanto, endereçado a todos os seres humanos. Como o conhecimento do homem aumentou, ele agora é capaz de apreciar o significado deste versículo mais profundamente. Ele sabe que algo aconteceu muito tempo antes do fenômeno diário da chuva ser estabelecido. Talvez a teoria mais próxima da verdade relacionada à formação dos oceanos (que consiste na evaporação da agua e, em seguida, no retorno como chuva) afirma que eles foram formados em algum lugar acima da terra e foram, então, derramados em torrentes. Um cientista contemporâneo fala sobre este assunto: se for verdade que a temperatura da terra, no momento da separação do sol foi de cerca de 12,000 graus, ou a da superfície do sol, todos a elementos eram livres e, portanto, nenhuma combinação química de importância poderia existir. Aos poucos, a terra (ou os fragmentos de formação de terra) foi resfriada e as combinações começaram a acontecer, sendo formado o núcleo da terra como nós o conhecemos hoje em dia. O oxigênio e o hidrogênio não poderiam se combinar até que a temperatura fosse reduzida a 4.000 graus Fahrenheit. Neste ponto esses elementos se combinariam formando a água. O que conhecemos como a atmosfera deveria ser enorme naquele momento. Todos os oceanos estavam no céu e todos os elementos não combinados pairavam no ar como gases. A água, que se formou no exterior da atmosfera, caiu para a terra, mas não conseguiu chegar, pois a temperatura próxima da terra era mais alta do que a milhares de quilômetros acima. Com o tempo, a agua conseguiu chegar à superfície terrestre, mas novamente subia como vapor. Com oceanos inteiros no ar e as inundações constantes, o resfriamento da terra progrediu. 5

Apesar de não reivindicar qualquer vínculo definitivo entre esta teoria em particular e a declaração corânica, reconhecemos que a teoria nos dá uma melhor compreensão do que significa e o período da história a que se refere, ou seja, o período de água caindo em torrentes. A teoria tem grandes chances de ser provada correta. Por outro lado, outras teorias podem ser propostas para explicar a origem da água. A declaração corânica, no entanto, permanece válida para todas as idades e sociedades.

Esta é a forma como a produção de alimentos começa: “Nós fizemos entornar a água abundantemente” (Versículo 25). Ninguém pode dizer que produziu água, em qualquer fase da sua formação, ou dizer ter feito com que ela tenha sido derramada, para que o processo de produção de alimentos pudesse ser posto em prática.

“Em seguida, fendemos a terra, suficientemente” (Versículo 26). O homem primitivo vê a chuva caindo e percebe que ele não tem poder sobre ela. Ele vê a separação do solo com a penetração da água. Ele também vê as plantas crescerem na terra pela vontade do Criador. Ele percebe que as plantas são finas e sensíveis e a terra é pesada e resistente, mas a mão do Criador permite que as plantas brotem da terra, se movendo através dela. Qualquer um que contempla como as plantas crescem pode reconhecer o milagre envolvido aqui. Conforme o conhecimento humano vai se expandindo, uma nova compreensão dessa afirmação pode ser desenvolvida. A preparação da terra para que ela tenha se tornado adequada para a vegetação pode ter ocorrido há muito tempo. A declaração corânica pode referir-se a múltiplos quebrar-se de rochas da superfície da terra, causados ??pelas grandes enchentes e pelos diversos fatores climáticos que, segundo os cientistas modernos, contribuíram para a formação de uma camada de solo onde a vegetação pode crescer. Esta interpretação se encaixa bem próxima à sequência de eventos relatados aqui.

De qualquer forma, a terceira etapa é o crescimento de todos os tipos de vegetação. O tipo mencionado aqui é o mais conhecido para as pessoas: “E nela fizemos brotar grãos” (Versículo 27). Refere-se a todos os cereais e grãos utilizados para alimentação humana ou animal. “E videira e hortaliças.” (Versículo 28). A referência aqui são os frutos de videira bem conhecidos e todos os vegetais que podem ser comidos crus. “E oliveiras e tamareiras, e pomares entrelaçados, e frutas e pastagens.” (Versículos 29-31). O azeite e os frutos das tamareiras são bem conhecidos a todos os árabes.  Os pomares entrelaçados referem-se aos campos cercados de árvores frutíferas. Eles são descritos aqui como sendo densos. O termo árabe “abb“, traduzido aqui como pastagens, refere-se com toda a probabilidade à pastagem utilizada para o gado. Como mencionado no comentário sobre a Surah anterior, ‘Umar perguntou o que abb significava e, em seguida, se culpava por perguntar. Então seguimos a ideia de ‘Umar sem adicionar nada ao que já foi mencionado.

Esta é a história dos alimentos, cuja provisão é cuidadosamente planejada pela Mão que criou o homem. O homem não desempenha nenhum papel em qualquer de suas etapas. Mesmo as sementes e grãos que ele lança sobre a terra não são de sua fabricação. O aspecto milagroso aqui reside na produção destas sementes e grãos, que está além da compreensão humana. Várias sementes podem ser plantadas no mesmo pedaço de terra, irrigada pela mesma água; mas cada uma produz o seu próprio fruto. É a mão do Criador que orna esta coleção infinita de plantas e seus frutos, e preserva na pequena semente as características de sua planta-mãe, de modo que elas possam reaparecer na planta que brotará. O homem permanece ignorante dos segredos deste processo. Ele não tem poder sobre isso. É a produção de Deus: “Tudo, para gozo de vós e de vossos rebanhos.” (Versículo 32).

Este prazer é, no entanto, por um período limitado. Segue-se algo totalmente diferente, que precisa ser cuidadosamente considerado pelo homem antes que o dia do juízo chegue de fato.

Um sinal da Ressurreição

“Então, quando chegar o soar ensurdecedor, um dia, quando a pessoa fugir de seu irmão, e de sua mãe e de seu pai, e de sua companheira e de seus filhos, nesse dia, para cada um destes, haverá uma situação que o preocupará. Nesse dia, haverá faces radiantes, sorridentes, exultantes. E, nesse dia, haverá faces cobertas de poeira, cobri-las-á um negrume. Esses serão os renegadores da Fé, os ímpios.” (Versículos 33-42).

Este é o fim de toda a alegria e prazer. Ele se encaixa perfeitamente ao planejamento e projeto que incluiu todas as fases do desenvolvimento do homem. O fim retratado aqui, se encaixa perfeitamente ao cenário no início da Surah que mostra alguém vindo com sentimento de zelo e temor em seu coração, e outra pessoa, que se considera autossuficiente, e se afasta da orientação divina. Aqui nós temos a exposição do ponto de vista de Deus.

“O soar ensurdecedor” é a tradução mais próxima de um termo árabe, al-??khkhah, o qual carrega um tom muito acentuado: que quase fura as orelhas. Este efeito apenas nos prepara para a seguinte cena, “Um dia, quando a pessoa fugir de seu irmão, e de sua mãe e de seu pai, e de sua companheira e de seus filhos” (Versículos 34-36). Tais laços entre uma pessoa e seus parentes próximos não podem ser cortados em circunstâncias normais. No entanto, o soar ensurdecedor destrói essas ligações, que se desfazem no ar.

O temor descrito nesta cena é puramente psicológico. Ele atinge a alma, a isola e a prende em suas garras. O resultado é que cada um de nós vai pensar apenas em nós mesmos. Ninguém terá qualquer tempo ou energia para pensar nos outros: “Nesse dia, para cada um destes, haverá uma situação que o preocupará” (Versículo 37). A descrição é vívida; não podendo haver declaração mais curta, e ainda sim abrangente, para descrever a condição geral das mentes e almas preocupadas.

Quando o soar ensurdecedor ocorrer, a condição é universal. Em seguida, segue-se uma descrição das condições dos crentes e dos incrédulos, depois dos dois grupos serem divididos e atribuídos os valores e padrões divinos para cada um deles respectivamente: “Nesse dia, haverá faces radiantes, sorridentes, exultantes” (Versículos 38-39). Essas faces radiantes transbordarão de alegria. São esperançosas e tranquilas porque sentem que o seu Senhor está satisfeito com elas. Estas pessoas serão poupadas do terror do soar ensurdecedor, assim eles podem se dar ao luxo de sorrir e demonstrar a sua alegria. Ainda, provavelmente, os sorrisos e as manifestações de felicidade podem ser em decorrência de que essas pessoas já perceberam o bom fim que os aguarda.

E, nesse dia, haverá faces cobertas de poeira, cobri-las-á um negrume. Esses serão os renegadores da Fé, os ímpios.” (Versículos 40-42). Essas faces serão cobertas com o pó da tristeza e da miséria, escurecidas com a humilhação e a depressão. Eles sabem o que fizeram nesta vida e esperam a sua inevitável punição. “Esses serão os renegadores da Fé, os ímpios.” (Versículo 42). Essas pessoas são desprovidas de fé. Eles não acreditam em Deus ou na Mensagem Divina. Além disso, seus corações estão endurecidos em seus caminhos errantes. Eles, persistentemente, violaram os mandamentos divinos dia após dia.

O destino de cada grupo é retratado em seus rostos. É elaborado um retrato vívido com palavras e expressões – um fato que comprova o imenso poder, que é a característica principal do estilo corânico. A abertura e o fechamento da Surah estão em perfeita harmonia. A abertura estabelece um princípio fundamental e um padrão geral, e o fechamento nos mostra os resultados da aplicação desta norma. Mesmo sendo uma Surah curta, possui uma série de fatos e de princípios fundamentais, que retrata um grande número de cenas, utilizando diferentes ritmos. Além disso, o estilo traz estas imagens em alto relevo.

Notas do Autor

2. Todos estes foram os estudiosos do mais alto calibre, sendo os quatro primeiros companheiros do Profeta. Os outros passaram seus estudos para as gerações seguintes.

3. Esses detalhes são baseados em informações dadas por AH al-Guindi em seu livro Abu Hanifa, Cairo.

4. O autor está se referindo aqui à antiga União Soviética, que foi uma das duas superpotências em seu tempo.

5. A. Cressy Morrison, O Homem não Está Sozinho, Londres, 1962, pp. 25-26.


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