Sermão da Sexta-Feira em Idioma Local

Sermão da Sexta-Feira em Idioma Local
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É muito comum, em comunidades onde o idioma local não é o árabe, que se visite mesquitas onde o sermão de sexta-feira (khutbah) é feito em árabe. Muitas vezes, sem qualquer tradução para o idioma local. Esta é uma situação totalmente inaceitável, visto que o propósito da khutbah é exatamente passar a Mensagem de Allah, swt, às pessoas em geral. A tradução simultânea ou mesmo a tradução posterior ao sermão já é algo que reduz a eloquência da mensagem, mas ainda assim é a única solução para aquelas comunidades onde não há imam que fale o idioma local. A situação ideal é aquela em que a maioria das pessoas presentes, assim como o khatib (orador), falem o mesmo idioma. Só desta forma o objetivo da clareza da mensagem é atingido.


Quando analiso esta questão, torna-se claro para mim que o cerne dela está na falta de espaço que os Muçulmanos revertidos ao Islam possuem em suas próprias comunidades, dentro de seus próprios países. A responsabilidade não é de ninguém, senão dos próprios revertidos, nativos e residentes, que não exigem que haja uma preocupação efetiva com a sua educação e conscientização islâmica. As mesquitas são centros de reunião e educação dos Muçulmanos, assim como locais onde os não- Muçulmanos podem buscar informação sobre o Islam. Portanto, o mínimo que esperamos é que o líder religioso fale o idioma local.

Quando o líder de uma mesquita consegue se comunicar no mesmo idioma que é falado no país onde reside não só a comunidade muçulmana se beneficia, mas também a sociedade em geral. Quando alguém com autoridade e conhecimento se expressa adequadamente no idioma local, provavelmente, compreende as particularidades daquele povo e daquela cultura, estabelecendo, assim, um vínculo mais profundo com a sociedade em geral. É desta forma que a da’wah (divulgação do Islam) mais consistente é feita, através de uma plena comunicação, sem barreiras ou empecilhos.

As mesquitas são centros religiosos, na maioria absoluta dos casos, associações religiosas e sem fins lucrativos, como toda associação, devem existir para beneficiar a comunidade que as cerca. Então, baseados nisso, questionamos: qual a razão, por exemplo, de uma mesquita brasileira, possuir um imam que fale apenas árabe, uma vez que, a maioria dos Muçulmanos fala português? Portanto, refletindo sobre o tema, trago algumas considerações, extraídas do site islamqa.info, com evidências sobre a permissibilidade – ainda mais, a preferência – da khutbah do jumu’ah ser oferecida em idioma local:

Os fuqaha’ concordam unanimemente que é melhor para o khutbah estar em árabe, mas eles diferiram quanto a isso ser essencial.

Existem três pontos de vista:

1- Que é essencial que o sermão seja em árabe para aquele que é fluente nesta língua, mesmo que os ouvintes não conheçam o idioma árabe. Esta é a visão dos Maalikis e é a visão bem conhecida dos Hanbalis.

Veja: al-Fawaakih al-Diwaani (1/306) e Kashshaaf al-Qinaa’ (2/34).

2- Que é essencial que seja em árabe para quem é fluente na língua, a menos que nenhum dos ouvintes conheça o árabe, caso em que deve-se fazer a khutbah em seu idioma. Esta é a visão correta de acordo com os Shaafa’is, e é a visão de alguns dos Hanbalis.

Veja: al-Majmu’, por al-Nawawi (4/522).

3- É mustahabb que a khutbah seja em árabe, mas não é essencial, e o khatib pode fazê-la em seu próprio idioma, em vez do árabe. Esta é a visão de Abu Hanifah e alguns dos Shaafa’is.

Veja: Radd al-Muhtaar (1/543) e al-Mawsu’ah al-Fiqhiyyah (19/180).

Esta terceira visão é a correta, e é a visão favorecida por vários sábios contemporâneos, porque não há provas claras que indiquem que a khutbah deve ser dada em árabe, e porque o objetivo da khutbah é exortar, beneficiar e ensinar, o que só pode ser feito através do idioma das pessoas presentes.

Foi dito em uma declaração do Conselho de Fiqh da Liga Mundial Muçulmana:

“A opinião mais justa é que usar o árabe ao fazer a khutbah na sexta-feira e no ‘Eid, nos países onde este idioma não é falado, não é condição de validade desta, mas é melhor dizer as introduções da khutbah e todos os versículos do Alcorão que forem citados em árabe, para que os não árabes se acostumem a ouvir o árabe e o Alcorão, o que tornaria mais fácil aprender e ler o Alcorão no idioma em que foi revelado. Então, o khatib pode prosseguir à introdução com a exortação no idioma que as pessoas presentes entendam.” Fim da citação. Qiraaraat al-Majma’ al-Fiqhi (página 99, quinta sessão, quinta declaração).

Os sábios do Comitê Permanente para Emissão de Fatawa (pareceres islâmicos) disseram: “Não há nenhuma prova no hadith que sugira que o Profeta (que a paz e as bênçãos de Allah estejam sobre ele) tenha estipulado que a khutbah de sexta-feira deveria ser em árabe, ao contrário, ele fez a khutbah em árabe porque era seu idioma e a língua de seu povo. Então, quem se dirigia às pessoas e as orientava falava em seu idioma para que entendessem…” Fataawa al-Lajnah al-Daa’imah (8/253).

Shaikh Ibn ‘Uthaimin (que Allah tenha misericórdia dele) disse: “A visão correta sobre este assunto é que é permitido ao khatib fazer a khutbah em um idioma que as pessoas presentes compreendam, se as pessoas presentes não são árabes e não conhecem o árabe. Ele pode fazer a khutbah no seu idioma, porque esse é o meio de explicar-lhes, e o propósito da khutbah é explicar os limites sagrados de Allah aos Seus servos, exortá-los e orientá-los. Mas os versículos do Alcorão devem ser recitados em árabe, depois explicados na língua das pessoas presentes. 

O fato de que ele pode fazer a khutbah na língua do povo é indicado pelo versículo em que Allah diz (interpretação do significado): 

“E não enviamos Mensageiro algum senão com a língua de seu povo, para que ele torne evidente, para eles, a Mensagem” [Alcorão, surah Ibrahim, 14:4]
 

Allah afirmou que os meios de transmissão devem estar no idioma que as pessoas abordadas entendam. 

Com base nisso, ele pode fazer a khutbah em um idioma diferente do árabe, mas se houver recitação dos versículos do Alcorão, estes devem estar em árabe, no idioma o qual o Alcorão foi revelado, então, o khatib pode explicá-los às pessoas na sua língua.” Fim da citação. Fataawa Nur ‘ala al-Darb.

Por Letícia de Paula.


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