Por Que Estudiosos chamam “Apartheid” a Israel?
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A palavra apartheid carrega um peso histórico profundo. Ela foi originalmente usada para descrever o regime racista de segregação institucionalizada na África do Sul entre 1948 e 1994. Hoje, porém, muitos estudiosos, organizações internacionais e juristas de renome utilizam o mesmo termo para descrever o sistema de dominação que Israel impõe aos palestinos — tanto dentro do território de 1948 quanto nos territórios ocupados desde 1967.
Mas o que significa juridicamente apartheid? E por que cada vez mais especialistas aplicam esse conceito ao caso de Israel?
1. Definição legal de apartheid
Ao contrário do que muitos pensam, apartheid não é apenas um termo histórico sul-africano. Ele é uma categoria jurídica definida pelo direito internacional.
O Estatuto de Roma do Tribunal Penal Internacional (1998) define apartheid como:
“Atos desumanos cometidos no contexto de um regime institucionalizado de opressão e dominação sistemática de um grupo racial sobre outro, com a intenção de manter esse regime.” (Artigo 7(2)(h), Estatuto de Roma, 1998)
Já a Convenção Internacional sobre a Eliminação e Punição do Crime de Apartheid (1973) afirma que o apartheid inclui:
- Segregação territorial;
- Negação de direitos humanos e liberdades fundamentais;
- Prisões arbitrárias;
- Impedimento de participação política e social;
- Restrições à liberdade de movimento.
Essas definições não exigem que o modelo seja idêntico ao da África do Sul, mas que haja discriminação sistemática baseada em identidade racial, étnica ou religiosa.
2. Aplicando a definição ao caso de Israel
Diversos relatórios de organizações internacionais aplicam essas definições ao que ocorre entre Israel e os palestinos. Entre eles:
- Human Rights Watch (2021): “Threshold Crossed: Israeli Authorities and the Crimes of Apartheid and Persecution.”
- Amnesty International (2022): “Israel’s Apartheid against Palestinians: Cruel System of Domination and Crime against Humanity.”
- B’Tselem, organização israelense de direitos humanos (2021): “A regime of Jewish supremacy from the Jordan River to the Mediterranean Sea: This is apartheid.”
Esses relatórios apontam:
- Dois sistemas legais diferentes: judeus israelenses vivem sob lei civil; palestinos da Cisjordânia, sob lei militar;
- Restrições severas à liberdade de movimento dos palestinos, incluindo mais de 500 checkpoints, muros, e permissões especiais para ir de uma cidade a outra;
- Demolição sistemática de casas palestinas e expansão contínua de assentamentos exclusivos para judeus;
- Negação do direito ao retorno de refugiados palestinos, ao mesmo tempo em que qualquer judeu do mundo pode obter cidadania automática;
- Políticas de discriminação racial e religiosa dentro de Israel, como na educação, acesso à terra e financiamento público.
3. “Não é um conflito entre iguais”
A realidade israelense-palestina não é um “conflito entre dois lados iguais”, mas uma situação de domínio e subjugação prolongados, conforme reconhecido por diversos estudiosos do direito internacional.
A ocupação militar da Cisjordânia e Gaza dura mais de 50 anos. Em Gaza, apesar da retirada física dos colonos em 2005, Israel mantém o controle de fronteiras, espaço aéreo e marítimo — caracterizando, segundo a ONU, um “bloqueio total e ilegal”.
4. Apartheid é crime contra a humanidade
Tanto o Estatuto de Roma quanto a Convenção da ONU de 1973 classificam o apartheid como crime contra a humanidade. Ou seja, sua prática não é apenas uma injustiça política ou social — é um crime internacional passível de julgamento pelo Tribunal Penal Internacional.
Ainda assim, grande parte da comunidade internacional reluta em aplicar essa terminologia a Israel, temendo pressões diplomáticas e acusações de antissemitismo. Mas a verdade é que criticar o Estado de Israel não é o mesmo que odiar judeus. Muitos judeus — inclusive israelenses — são vozes ativas contra o apartheid e em defesa da dignidade palestina.
5. O silêncio como cumplicidade
A normalização do apartheid por parte da mídia e dos governos só contribui para o sofrimento do povo palestino. Ignorar essa realidade, esconder os fatos e justificar a opressão com narrativas de “autodefesa” é perpetuar o ciclo de injustiça.
Allah diz no Alcorão:
“Ó vós que credes! Sede firmes, pela causa de Allah, como testemunhas com equidade. E que o ódio por um povo não vos incite a serdes injustos. Sede justos! Isso está mais próximo da piedade.” (Surat al-Ma’idah, 5:8 — Tradução de Helmi Nasr)
Este princípio de justiça é central na ética islâmica, mesmo quando se trata de inimigos.
Conclusão
Chamar Israel de regime de apartheid não é retórica exagerada, mas análise jurídica baseada em evidências. O uso desse termo por estudiosos e instituições de direitos humanos visa pressionar por justiça, igualdade e fim da ocupação.
Reconhecer o apartheid é o primeiro passo para desmantelá-lo. Como na África do Sul, a mudança começa quando a verdade é dita com coragem.
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