Muhammad ﷺ, não "Maomé"
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Muhammad ﷺ, não “Maomé”

Por que não “Maomé”?

Entre os muitos equívocos difundidos no Ocidente sobre o Islam, poucos são tão comuns e persistentes quanto o uso do nome “Maomé” para se referir ao último Profeta do Islam. Embora a intenção de quem usa o termo nem sempre seja ofensiva, a origem e o significado histórico da palavra revelam um problema mais profundo: ela distorce o nome real do Profeta Muhammad ﷺ e carrega conotações depreciativas que surgiram durante o período das Cruzadas.

Para os muçulmanos, o nome Muhammad — que significa “o louvado, o digno de louvor” — é um nome sagrado, escolhido por Allah e mencionado diretamente no Alcorão. Entender por que o termo “Maomé” é incorreto e ofensivo é essencial não apenas por respeito religioso, mas também para promover diálogo inter-religioso honesto e livre de preconceitos.

O nome escolhido por Allah

O Alcorão menciona o nome do Profeta Muhammad ﷺ em várias passagens, como:

“Muhammad não é pai de nenhum dos vossos homens, mas é o Mensageiro de Allah e o selo dos profetas.”
(Surata Al-Ahzab, 33:40)

“E aqueles que creem e fazem boas obras e creem no que foi revelado a Muhammad, e isso é a verdade de seu Senhor, Ele apagará suas más ações e corrigirá sua situação.”
(Surata Muhammad, 47:2)

O próprio nome Muhammad vem da raiz árabe ḥamd (حمد), que significa louvor, e expressa um significado intensamente espiritual: aquele que é constantemente louvado. É o mesmo radical presente em palavras como al-ḥamdulillah (“todo louvor pertence a Allah”).

Assim, o nome Muhammad não é apenas uma identificação pessoal — é um título de honra concedido por Allah, o Criador, ao Seu último Mensageiro ﷺ. Distorcê-lo, portanto, não é uma simples variação linguística, mas uma alteração que remove o significado divino e introduz distorção.

A origem do termo “Maomé”

O termo “Maomé” surgiu no contexto da Europa medieval, durante as Cruzadas (séculos XI–XIII). Muitos escritores e clérigos cristãos daquela época, desconhecendo a língua árabe, transliteraram incorretamente o nome Muhammad. Contudo, essa deformação não foi neutra.

Autores europeus, especialmente na França, Inglaterra, Portugal e Espanha, criaram o termo “Mahomet” (ou “Maomé”, em português), derivado de uma mistura incorreta entre “Muhammad” e palavras latinas e francesas associadas a idolatria e engano.

Em algumas crônicas medievais, “Mahomet” foi descrito como um deus falso, um ídolo de ouro ou mesmo um demônio adorado pelos muçulmanos — uma representação totalmente oposta à realidade monoteísta do Islam.

Essa imagem distorcida foi disseminada por textos como:

  • La Chanson de Roland (século XI), em que “Mahom” é mencionado como um ídolo pagão.
  • Livre du Trésor de Brunetto Latini, que associa “Mahomet” à idolatria.
  • E diversas crônicas portuguesas e espanholas da Reconquista, que reproduziam essa narrativa para justificar as guerras religiosas.

Portanto, “Maomé” não é uma tradução; é uma distorção histórica e teológica, nascida de um período de hostilidade e propaganda contra o Islam.

Por que é ofensivo

  1. Distorce o nome sagrado:
    O nome Muhammad contém o significado de “louvado”. “Maomé” não tem qualquer relação linguística com esse significado — e, foneticamente, soa rude e distante do original árabe.
  2. Carrega herança islamofóbica:
    Como o termo foi usado em contextos onde o Profeta ﷺ era difamado, ele traz uma carga histórica de desprezo. Os muçulmanos associam esse termo a séculos de caricaturas, insultos e falsas acusações.
  3. Mostra falta de respeito:
    Assim como seria inaceitável deturpar nomes sagrados de outras religiões — por exemplo, chamar “Jesus” de um nome zombeteiro — o mesmo se aplica ao nome do último Profeta do Islam. Allah ordena respeito aos mensageiros: “Não façais diferença entre nenhum dos Seus mensageiros.” (Surata Al-Baqarah, 2:285)
  4. Contraria a etiqueta islâmica:
    Os muçulmanos são instruídos a sempre mencionar o Profeta ﷺ com reverência, acrescentando a expressão “sallallahu ‘alayhi wa sallam” (que a paz e bênçãos estejam sobre ele – ﷺ), conforme ensinado pelo próprio Profeta ﷺ: “O avarento é aquele diante de quem sou mencionado e não envia bênçãos sobre mim.” (Jami‘ at-Tirmidhi, 3546)

Assim, ao substituir Muhammad ﷺ por “Maomé”, perde-se o respeito e a bênção associados à menção do nome do Mensageiro de Allah.

O nome nas traduções do Alcorão

Nenhuma tradução séria do Alcorão, seja em português, inglês, francês ou espanhol, usa “Maomé” como tradução. Todas mantêm “Muhammad” em árabe transliterado, reconhecendo o caráter sagrado do nome.

A tradução do Dr. Helmi Nasr — amplamente usada nos países lusófonos — preserva o nome Muhammad em todas as passagens, reforçando que ele não deve ser adaptado por razões culturais ou fonéticas.

Além disso, estudiosos de diferentes tradições religiosas têm reconhecido essa importância. A orientalista britânico Karen Armstrong, em seu livro Muhammad: A Prophet for Our Time, observa:

“Chamar o Profeta de ‘Mahomet’ é um equívoco histórico que perpetua a ignorância medieval sobre o Islam.”

Equívocos e estereótipos modernos

Mesmo após séculos, o termo “Maomé” ainda é usado por jornais, enciclopédias e até mesmo livros didáticos, perpetuando um estereótipo linguístico colonial. Essa insistência reflete um resquício de arrogância cultural, que insiste em adaptar os nomes islâmicos aos moldes ocidentais.

É importante entender que a língua árabe tem sons e estruturas diferentes, e os muçulmanos não esperam que todos pronunciem o nome perfeitamente. Mas o mínimo de respeito é preservar a transliteração correta: Muhammad ﷺ.

O respeito aos profetas no Islam

Os muçulmanos creem em todos os profetas enviados por Allah, incluindo Noé, Abraão, Moisés e Jesus (que a paz esteja sobre todos eles). O Alcorão ensina que todos devem ser honrados igualmente:

“Diz: Nós cremos em Allah e no que foi revelado a nós e no que foi revelado a Abraão, Ismael, Isaque, Jacó e às tribos; e no que foi dado a Moisés e a Jesus, e no que foi dado aos profetas por seu Senhor; não fazemos distinção entre nenhum deles.”
(Surata Al-Baqarah, 2:136)

Assim, respeitar o nome de Muhammad ﷺ é também respeitar a mensagem de todos os profetas, pois ele é o último elo da mesma corrente profética.

O que significa respeito verdadeiro

Usar o nome Muhammad ﷺ corretamente é um gesto simples, mas poderoso, de reconhecimento e respeito. Ele mostra abertura, aprendizado e empatia — valores que o próprio Profeta ﷺ exemplificou.

Ele foi descrito por Allah como:

“E por misericórdia de Allah, foste gentil com eles. Se fosses rude ou duro de coração, eles teriam se afastado de ti.”
(Surata Al-Imran, 3:159)

Seguir esse exemplo significa tratar a fé dos outros com a mesma cortesia e dignidade que desejamos para a nossa.

Conclusão

Chamar o último Profeta do Islam de “Maomé” é uma prática que deve ser deixada no passado. Ela nasce de um erro linguístico medieval, perpetua um legado de desinformação e preconceito, e ignora o significado profundo do nome Muhammad ﷺ, que representa luz, misericórdia e louvor.

Usar o nome correto — Muhammad ﷺ — não é apenas uma questão de precisão histórica; é um ato de respeito e um passo essencial para superar séculos de mal-entendidos entre muçulmanos e não muçulmanos.

Referências

  • Alcorão Sagrado, Suratas Al-Ahzab (33:40), Muhammad (47:2), Al-Baqarah (2:136, 2:285), Al-Imran (3:159).
  • Jami‘ at-Tirmidhi, 3546.
  • Tafsir Ibn Kathir – explicação de 33:40.
  • Karen ArmstrongMuhammad: A Prophet for Our Time (HarperCollins, 2006).
  • IslamQA.infoThe proper way to refer to the Prophet Muhammad ﷺ.
  • La Chanson de Roland (século XI) e Livre du Trésor (Brunetto Latini).

Leia mais em Muhammad – O Mensageiro de Allah ﷺ

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